segunda-feira, 30 de maio de 2011

COTIDIANO DA NOVA BARBÁRIE - SOBRE ÍNDIOS E CONQUISTADORES, QUIXOTES E SANCHOS PANÇA...

Enojado pela hipocrisia dos tempos que passam, tenho negligenciado o ofício da palavra e o dever que me fustiga a multiplicação desse modesto talento.  

contemplo o silêncio que já se estabelece sobre o desastre e as vítimas de Fukushima.  e a produção de energia em usinas nucleares segue manutenida pelos governos de lá, de cá e de acolá, como uma fonte "limpa" de energia

terça-feira, 29 de março de 2011

Me poupem a análise das últimas eleições no RS... o que caberia dizer, escrevi-o há muito tempo. Justo no início do Governo Yeda Crusius.


AS 21 CONDIÇÕES POLÍTICAS E A REGRA DE OURO DA
BOA GOVERNANÇA

Por Eduardo Dutra Aydos
Cientista político

                        As considerações que seguem, não configuram uma receita para a conquista, manutenção e consolidação do poder pelo poder. Não pretendem, pois, disputar, no terreno da mera eficácia eleitoral ou eficiência administrativa, o espaço dos manuais e a emulação das técnicas, que prometem sucesso a qualquer preço ou por qualquer causa. São dedicadas aos cidadãos que desejam entender e praticar os valores republicanos e o respeito à institucionalidade democrática, princípios e virtudes cívicas que nos cobram desprendimento, tenacidade e consistência na construção da liberdade.

            Visualizo a consecução da boa governança sob três aspectos, que se sucedem no tempo - mas que não se circunscrevem, nos seus efeitos, aos respectivos limites. Não têm, ademais, a mesma duração, intensidade ou conseqüência, mas são igualmente cruciais para o sucesso do empreendimento público. Trata-se dos processos da eleição, da transição e da administração. Processos estes, que impulsionam, respectivamente, os interesses da credibilidade, governabilidade e racionalidade da relação política. (O quadro a seguir descreve intuitivamente as condições que cada uma destas fases deve performar.)

DINÂMICA
DA ELEIÇÃO
LÓGICA
DA TRANSIÇÃO
MISSÃO 
DA ADMINISTRAÇÃO
Função básica:
GANHAR CREDIBILIDADE
Função básica:
ASSEGURAR GOVERNABILIDADE
Função básica:
PROMOVER RACIONALIDADE
1.      Legitimar a candidatura
2.      Estabelecer alianças
3.      Ajustar o discurso
4.      Combater o adversário
5.      Convergir interesses
6.      Mobilizar apoio
7.      Conquistar o voto
8.      Consolidar a liderança
9.      Apropriar expectativas
10.  Construir a tática
11.  Mapear os obstáculos
12.  Potencializar resultados
13.  Diferir a crise
14.  Antecipar a mudança
15.  Exercer autoridade
16.  Fixar prioridades
17.  Implementar a estratégia
18.  Oferecer segurança
19.  Gerar sinergia
20.  Produzir satisfação
21.  Promover a obra feita
22. REGRA DE OURO: Fazer o sucessor

            O exame de cada uma, destas três grandes dimensões da boa governança, sugere a ultrapassagem de alguns tabus do nosso conhecimento sobre a política, entre os quais: (a) a redução formalista do processo eleitoral aos três meses que antecedem o comparecimento às urnas; (b) a idéia que a transição do governo é o período que se estende desde a eleição até a posse: e (c) a ilusão de que a função mais difícil e mais extensa do eleito será, propriamente, a de administrar.

            Na democracia constitucional, a dinâmica da eleição é a mais extensa de todas as etapas a serem cumpridas pelo aspirante ao governo. Grosso modo, tem a duração mínima de dois períodos governativos: começa no dia em que foram proclamados os resultados da eleição do seu antecessor e se encerra no momento da entrega do governo ao seu sucessor. A lógica da transição, por sua vez, contrariando o senso comum das coisas, que a circunscreve aos poucos meses de interregno, entre a vitória nas urnas e a investidura no governo, é a segunda etapa de maior duração. A transição começa naquele momento da eleição em que se inicia o combate ao contendor político. E se projeta no tempo de governo, até que se estabeleça a segurança dos objetivos e do novo modo de administrar. Enfim, a promoção da racionalidade administrativa é, de fato, a mais curta e talvez, por isso mesmo, a menos envolvente e perceptível destas três etapas. Para alguns, talvez, nunca se torna efetiva. Porque o seu sucesso está ancorado, quase deterministicamente, no manejo bem sucedido das condições - que lhe são anteriores e, ao mesmo tempo, contemporâneas - da eleição e da transição.

            Em síntese, para bem governar é necessário assegurar-se, desde antes da vitória nas urnas, as condições políticas para o manejo da própria sucessão; e, desde a investidura no cargo, as condições táticas para que o novo modo de governar seja efetivamente implementado. É só no desempenho concomitante e bem sucedido destas etapas antecedentes que o incumbente - já como estadista - se terá qualificado para a gestão estratégica do próprio governo Nessa condição, além promover no espaço político a obra feita, terá de dar-lhe a conseqüência necessária da força acumulada pelo seu estilo de fazer política. A expressão cunhada de Luis XV – “aprés moi le deluge” - neste sentido, é demissionária e incompatível com o padrão governativo da República e da Democracia.

                        A realização plena e articulada das três etapas da boa governança, por sua vez, implica na consecução da sua regra de ouro: fazer o sucessor. No geral, nossos governantes têm prestado atenção mínima às condições essenciais da sua credibilidade política e, no restante, têm sido transeuntes na sua própria tarefa de governar. Ao fim de sua administração, surpreendem-se, ainda, conduzindo uma transição mal sucedida dos estrangulamentos da administração passada. O seu erro essencial, me parece, radica no desconhecimento ou desatenção das duas primeiras, dentre as vinte e uma condições da boa governança acima enunciadas: legitimar a candidatura e estabelecer alianças.

            Por primeiro, no ponto de partida de uma candidatura vitoriosa, é preciso dar-se expressão à voz do partido. Depois, a sua consistência e conseqüência políticas deverão conviver e ajustar-se às restrições e concessões impostas, pela disputa sobre o terreno das eleições, pela partilha dos recursos e dos cargos na administração e pelas contingências que a função de Estado impõe ao governante perante a Nação como um todo. O principal equívoco, entretanto, do modo tradicional de governar, neste ponto, tem sido o de que, ao ultrapassar o umbral do governo, as suas lideranças tendem a fechar o portal do partido. Quando precisarem retornar a ele, para recarregar a moral das suas baterias, terão que reaprender as regras novas e as senhas de acesso, que a vida política na planície do poder cunhou à sua revelia. Para muitos, esse divórcio tem sido fatal. Como o foi, certamente, para os governos anteriores do Rio Grande, dos quais o PSDB participou como força política coadjuvante. Refiro expressamente o governo PDT com Alceu Collares e os governos do PMDB com Antônio Britto e Germano Rigotto.

            Por segundo, a ciência política tem por axioma que a coalizão ideal de governo - como força parlamentar de apoio - até pelos prospectos da sua estabilidade, seria aquela que se fixasse, com segurança, em 51% do contingente possível dos seus apoiadores. Isso porque, uma vez no governo, será mais fácil remunerar-se politicamente 51% do que 75% ou mais, de expectativas geradas no âmbito da sociedade. Essa formulação teórica, não obstante, atende mais propriamente à dinâmica específica do governo parlamentarista. É uma regra a ser considerada, pelo realismo intrínseco da sua formulação, porém com ressalvas. A principal delas diz sobre o fato que, o governante eleito pelo voto popular direto - como é o nosso caso - responde duplamente: perante a sua base de apoio partidário e parlamentar, mas, também, perante a totalidade da cidadania. A estabilidade do presidencialismo de coalizão, de alguma forma, constrói-se no equilíbrio desta interlocução dual.

            Convém utilizar-se, pois, como fatores de restrição, no dimensionamento da coalizão de governo, mais do que simples critério de número, regras de qualidade, que sejam capazes de consolidar, como um núcleo duro de força agregativa - seja qual for o número e a expressão política dos seus integrantes - o compromisso da auto-contenção das suas próprias demandas. Trata-se, aqui, de contornar-se o vaticínio acadêmico, segundo o qual uma coalizão muito ampla de forças políticas, conduziria: ou à sucumbência do governo pelo excesso de demanda política; ou à sucumbência da sociedade pela prodigalidade da sua satisfação pelo governo.

                        Em conclusão, é bom que se acautele o governante da importância que reveste o aparato protetor de uma política partidária orientada a princípios. Que seja articulada, mas autônoma, vis a vis do governo. E, por isso mesmo, capaz de oferecer limites claros e transparentes de concessão, seja às pretensões dos seus próprios apoiadores, seja às pressões dos seus contendores políticos e das demais instâncias de poder. A história é prenhe deste ensinamento: quando não consegue deduzir a inteira lição dessa primeira condição da boa governança - qual seja, “manter aberta a porta e viva a voz do partido” -, mais cedo ou mais tarde, e até por lhe faltar o conseqüente poder de barganha, o governante tende a sucumbir aos desafios que lhe defronta a segunda... -  qual seja, “estabelecer o limite das concessões possíveis e desejáveis aos seus aliados” . E daí para a frente o risco de naufrágio é iminente.
Gravataí, 04/12/2006



segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

ANISTIA: AMPLA GERAL E IRRESTRITA

Artigo recente, publicado em ZH (20/01/2011), argumentou que a lei de anistia foi votada por um congresso eleito pelas regras do AI-5, com maioria arenista, fato que supostamente a qualificaria como um mero gesto de auto-condescendência do regime militar para consigo mesmo; (ii) descarta, a relevância jurídica da Emenda Constitucional nº 26 de 1985 para a fundação da nova ordem constitucional: e, (iii) conclui que a Constituição de 1988, tendo tratado apenas da reparação econômica aos anistiados por razões estritamente políticas, teria revogado o caráter mais abrangente das normas anteriores.
Perante a História, essa retrospectiva, é substancialmente, falsa. Reescreve o episódio das lutas populares no Brasil, no capítulo da anistia, pela simples fotografia do ano de 1979. Desconhece o seu contexto e processo. E, por essa via, remete ao esquecimento o fato, que o movimento nacional pela ANISTIA AMPLA, GERAL E IRRESTRITA, iniciado nos anos 70, teve continuidade numa sucessão de eventos que culminam com a promulgação da Carta de 1988.
Juridicamente, a invocação do art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988 (ADCT), como critério único de abrangência do instituto da anistia, é ainda mais falaciosa. De fato, a Lei 6.683 de 26 de agosto de 1979, foi um edito capenga. Ao mesmo tempo que anistiou os agentes da repressão política, excluiu da sua abrangência os opositores ao regime condenados por terrorismo, assalto, seqüestro e atentado pessoal. Por isso mesmo, o movimento pela anistia não acabou em 1979, mas somente realizou seu desideratum pleno, no ato pré-constitutivo da ordem jurídica vigente, que foi a CONVOCATÓRIA da Assembléia Nacional Constituinte de 1987/88.
Foi a Emenda Constitucional nº 26 de 1985, promulgada por um Congresso multipartidário, com maioria de oposição, em regime de governo civil, que estendeu a anistia aos integrantes da oposição armada ao regime militar. Foi assim que se instituiu, no próprio Ato Convocatório da Assembléia Nacional Constituinte, a ANISTIA vigente: AMPLA, GERAL E IRRESTRITA. Isso que a qualifica, como uma condição jurídico-política fundante da nossa reconstitucionalização democrática. 
Sustentar que o conteúdo normativo da Emenda nº 26/85 seria irrelevante e que teria sido revogado, ou não recepcionado pela Carta de 1988, antes de tudo, é uma petição de princípios. Pois, não existe a possibilidade jurídica da interpretação e aplicação de uma Constituição, cuja legitimidade se pretende erodir pela nulificação dos termos da sua Convocatória.
Já a intenção indisfarçável de, assim, excluir do pálio da anistia aos agentes da repressão política do regime militar, acaba por promover, também, a exclusão de todos aqueles que pegaram em armas contra a ditadura e dos que, nesse diapasão praticaram crimes conexos (terrorismo, seqüestro, assalto, atentado...). Com efeito, a abrangência estreita do art. 8º do ADCT – sem remissão às normas anteriores – implicaria a nulidade de muitas reparações concedidas pela Comissão da Anistia do Ministério da Justiça, com a respectiva restituição aos cofres públicos e a punição dos responsáveis pelos atos de liberalidade.  E, dependendo de uma conceituação altamente subjetiva e polissêmica do que se entenda por terrorismo e democracia, na interpretação conforme do disposto no art. 5º, incisos XLIII e XLIV (CF), colocaria ao alvo de persecução e condenação criminais, pelos atos notórios de sua biografia pregressa, tipificáveis em tese como imprescritíveis e inafiançáveis, brasileiros ilustres e reconhecidas lideranças políticas, entre os quais a Presidente Dilma Roussef.
Essa intencionalidade escusa, e a inconsistência político-jurídica subjacente, não devem passar. Encontrarão, por certo, cerrada resistência na cidadania brasileira, tanto entre os eleitores do atual governo, como entre os seus opositores nas urnas de 2010.